terça-feira, 1 de julho de 2014

De tudo fica um pouco


De tudo fica um pouco - resíduo de Drummond – fica sim, de tudo um pouco.
Poema lindo pra tirar lá debaixo do tapete o que se tenta esconder, mas ainda está ali.
De tudo fica um pouco, um pouco de mim em você, um pouco de você em mim.
Um pouco fica e sai, outra quantia fica, talvez, por toda a vida.
Porque de tudo fica um pouco do bom que se acrescentou, se absorveu e se instalou na formação de uma nova personalidade, na evolução que houve com o sinalagmatismo de quem dá lá e toma cá.

“E de tudo fica um pouco.

Oh abre os vidros de loção
e abafa
o insuportável mau cheiro da memória.”

O cheiro é bom, Drummond, tal qual sinto, é bom.
É cicatriz, que diz a nova canção da Nação Zumbi:
Visível marca de um riscado inesperado

Pra lembrar e nunca mais esquecer
Visível marca de um riscado inesperado
Pra lembrar o que lhe aconteceu

Ficar bem desenhado só pra ser bem lembrado

Risco do erro, mal visto, mal quisto e mal olhado
Quem vê vira logo a vista para o outro lado
Mas essa daqui me traz uma boa lembrança, não preciso esconder
Mas essa daqui me traz uma boa lembrança, não vou mais esquecer

E seja como for, mangue-boys, eu me lembrarei, não esquecerei.
Não vou esquecer do prato de flores, mas precisei levar Minh ‘alma pra passear.
A lua nos chama, Lenine.
De tudo fica um pouco, mas as canções, estas ficarão muitas, esse canto espantou muitos males naquele percurso, mas se a gente não sabe mais rir um do outro, meu bem, então o que resta é chorar.
Temer findar é procrastinar e elevar a dor. Do fim, ninguém escapa. Levarão seu amor pelos braços, nem que seja a morte, como disse noutra crônica dia desses.
O amor acaba, como Xico Sá citou, acaba como na crônica de Paulo Mendes Campos:  “Numa esquina, por exemplo, num domingo de lua nova, depois de teatro e silêncio; acaba em cafés engordurados, diferente dos parques de ouro onde começou a pulsar..."
Diferente dos parques de ouro.
Diferente de quando os olhos brilhavam.
Diferente de quando a ânsia era pelo encontro.
Diferente de quando um abraço fazia esquecer o mundo.
Diferente de tudo que o tempo rouba.
O amor é filme e Deus é espectador, Lirinha.
É drama, aventura, mentira, comédia romântica.
Dele teme-se o fim, também o começo. O amor assusta. É drama, é suspense.
Amor não avisa quando vai, tampouco quando vem, simplesmente sai ou chega.
Avassalador, Lenine, chega sem avisar.
Chega, faz um estrago danado, é bom, fica, mas vai...
Acaba, Paulo Mendes Campos, “...de repente, ao meio do cigarro que ele atira de raiva contra um automóvel ou que ela esmaga no cinzeiro repleto, polvilhando de cinzas o escarlate das unhas.”
O amor acaba em 90 minutos, sem prorrogação. Alguém perde.
Dor inevitável nos dois vestiários subterrâneos, entranhas apartadas por um apito final.
Mas se de tudo fica um pouco, deixa as canções, as tantas canções tocar até enjoar, ou até outro amor roubar para si, a canção que um dia embalou nossos passos.
Porque amores serão sempre amáveis e futuros amantes, quiçá, se amarão sem saber, com o amor que um dia escapou pelos nossos dedos.


Mariano Sá.

4 comentários:

  1. Lindo, porém triste. Saudades Mari! Qdo vier a Recife avisa a gente. Bjos Paula Pio

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    1. Saudade tbm, Pio!! Quando eu for, é certo a stella na sua casa. =P
      Beijos e visite mais vezes o blog.

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