sexta-feira, 30 de janeiro de 2015

Quando fui jogador de futebol



Deparei-me com uma foto hoje, que trouxe a nostalgia.

Lembro bem, julho de 2012 – ano diamante -, faria minha primeira partida como jogador de futebol profissional, a realização de um sonho, meu e do meu pai. Singelo, pai. Discreto, sem holofotes ou fortunas, mas muito afortunado de ego.

Ver o nome no BID (boletim informativo diário da CBF), apto para jogar, saúde de ferro, a gente voava graças ao nobre amigo, preparador físico de altíssima qualidade e profissionalismo, professor André Portuga, um abraço, meu irmão, que a vida lhe seja sempre leve.

Era um tempo de aflição, eu trabalhava num escritório de advocacia, estudava pro exame de ordem e treinava no ÍBIS, black Bird, pior do mundo, completava meu curto tempo, e me enchia de sonhos, embora vivesse já dentro deste.

Julho de 2012.

Eu saí de casa as 7:30, tinha que chegar no escritório as 08hs, de lá, ao final do expediente - saindo mais cedo, claro - partiria para a concentração na cidade de Paulista, região metropolitana da capital dos altos coqueiros, eu estava treinando desde dezembro de 2011 com o grupo, esperávamos ansiosamente por essa data da estreia, à flor da pele. 

Quando saí de casa, minha mãe que não é nada poética, embora dramática, disse para mim: “vá brilhar meu filho!” Ela pouco se importava com isso, mas sabia o quanto era importante pra mim. 

Nem brilhei, mãe. Embora me sinta uma estrela por ser teu filho, nesse dia nem brilhei.

Quando cheguei na concentração, o clima era ótimo, ansiedade animada, espalhados pelos colchões no chão de uma casa alugada para apoiar alguns jogadores que vieram de fora, e também para nos concentrarmos, era nosso hotel de luxo, com arroz e feijão que a gente fazia o prato na panela mesmo, põe o prato no chão e o chão tá posto,  nobre Chico.

Era um batalhão, comandado por um homem, sonhador como nós, simples, rude, hilário, nervoso, amigo e filho da puta, a quem devo, além de um enorme respeito, a gratidão de quem comigo sonhou e realizou o meu sonho. Obrigado Professor Marcos Costa, que Deus o tenha na área técnica do maracanã celeste, que é onde você é e faz os outros felizes.

Já disse noutras crônicas, e sempre falo para os amigos: o que sei sobre ética e moral, aprendi com o futebol (a frase não é minha, mas a realidade é a mesma). 

Aprendi desde cedo, a lição mais nobre que o futebol me deu, qual foi, aprender a perder. 
Tarefa difícil. Mas eu sei, e as perdas e derrotas que tive na vida, encarei de cabeça erguida, talvez porque, lá nos primórdios da escolinha do colégio Anchieta, professor Guilherme me ensinou isso. 

Talvez por causa do pênalti que perdi numa final ainda na escolinha. Talvez pelo drible mais humilhante que levei na frente da menina mais bonita da escola. Talvez pelo náutico, talvez pelas disputas com André no winning eleven, talvez pelo gol perdido debaixo da barra no campo do santos dumont que tentei dar de letra, e Gilsinho me chamou de filho da puta, talvez pelo dedo esfolado no paralelepípedo na Hélio Falcão, 550, boa viagem, talvez pelo tornozelo torcido, pela queda no cadarço desamarrado, juvenil, pelo gol dado, pela vaia da torcida, pelo gol contra, pela bolada na cara ou nas partes íntimas, pelo “puta que pariu, Mariano, toca a porra da bola”, pelos 10 minutos ou dois gols que meu time saiu com 2 minutos de campo, por tudo que foi inglorioso, e se tornou glória no final. 

Eu que já não quero mais ser um vencedor e perder a glória de chorar, barbudos, eu mesmo não!

Quando chegamos no Ademir Cunha – o Paulistão – no vestiário, uma surpresa, Professor André tinha organizado com nossos familiares, namoradas, amigos, que fizessem algum cartaz com uma mensagem, fotos ou sei lá o quê... Sei que tava lá, feito por Marise, minha dileta companheira, um cartaz com o trecho da música tente outra vez de Raul, toca Raul nessa porra! 

As lágrimas escorriam naturalmente ao ver aquilo, não apenas por aquilo, mas por tudo descrito no parágrafo anterior. Por toda uma história esperando aquele dia, por todo incentivo do meu pai, homem que venceu na vida com os estudos, e queria que o filho fosse jogador de futebol, ah pai, eu não te decepcionaria nessa vida. Digo, talvez sim, mas nunca sem tentar acertar à sua altura.

Não chorava sozinho, e ouvi prantos maiores, nas paredes do vestiário estavam  histórias dos campos de várzea de tantos sonhadores como eu. Era um dia lindo. Aliás, é um dia lindo em minha memória. Perdemos o jogo, mas pouco importa. Foi lindo. Foi utópico e foi real.

Ah 2012, como te agradeço.

Tivemos, ao longo da competição, vários momentos emocionantes, que quem sabe eu os conte ao longo dessa vida, várias derrotas e pasme, vitórias também. O íbis entraria no livro dos recordes mais uma vez, porque naquele ano completaria 4 anos sem vitórias em partidas oficiais. Acabou! Tiramos isso, e nem fomos o último na competição. Jogávamos por um sonho e não por dinheiro. O dinheiro era pouco, e se esvaía com os próprios gastos com deslocamento para treinos e jogos. 

O sonho realizado era pago com suor, gratificante suor que se confundia com as lágrimas em meu rosto e eu nem sabia mais se o gosto de sal vinha dos poros ou dos olhos.

Deixo aqui, um agradecimento a todos os companheiros de equipe, a comissão técnica, ao presidente Urubu, aos torcedores, e todos que participaram direta ou indiretamente conosco.

Peço aos amigos, sempre que lembrarem de mim, no futuro, na velhice, numa memória póstuma, o que seja, digam que o amigo de vocês foi jogador de futebol profissional do íbis, isso me orgulha muito e ao meu pai também. =)


Mariano Sá.